A primeira vez que me lembro de ter vindo a São Paulo, talvez com nove ou dez anos, fui trazida pelas mãos de minha mãe e de meu avô.
Assustei-me com uma cidade que não tinha fim, que crescia para cima, para baixo e que parecia um verdadeiro formigueiro.
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Era Natal e fomos passear , primeiro de carro na 23 de Maio inaugurada há pouco e depois, de ônibus na Paulista, quando ainda era aquela avenida larga, linda, com alguns casarões (dos quais hoje resta apenas a Casa das Rosas, casa de encontro dos poetas paulistas).
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Ao subirmos no ônibus, não achamos lugares juntos; sentei-me um pouco à frente de minha mãe e meu avô ficou mais atrás.
A cada parada, pessoas iam se acomodando.
Comecei a me afligir porque agora já havia pessoas em pé entre minha mãe e eu e, meu avô, eu já havia perdido de vista.
A cada parada ninguém descia, só subia.
E eu já não enxergava direito minha mãe.
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E se eles descerem e me esquecerem? pensava eu.
E se eles, ao descerem, não conseguirem me levar junto? sofria eu.
Tamanho meu desassossego que, em um ímpeto de medo e insegurança, fiquei em pé sem me apoiar em nada.
No exato momento em que o motorista deu uma freada brusca, talvez por imprudência de algum pedestre ou outro motorista.
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Sem equilíbrio, comecei a despencar corredor à fora, defendendo-me como podia, desequilibrando os outros, agarrando pernas, vestidos, calças (aqui entre nós e para o bem da verdade, agarrei em um senhor que, tenho a impressão, não se esqueceu tão cedo de minhas mãos pequenas porém muito fortes, a apoiar-se aonde não devia…)
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Quando o chão do ônibus já estava no meu campo de visão, senti alguém me segurar e me erguer rapidamente, de modo que não cheguei a me ferir.
E fui olhando aquela imensa mão no meu braço, coberta por uma luva branca e, assim, fui percorrendo com os olhos o seu braço em um casaco vermelho vibrante, até chegar em seu rosto de barba comprida e branca, capuz na cabeça…
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Não cabia em mim de felicidade por ter sido salva pelo Papai Noel!
Procurei minha mãe e avô, como que para confirmar o que havia acontecido.
Lá no fundo do ônibus, meu avô sorria doce e cúmplice de minha felicidade e minha mãe logo disse, Agradeça ao Papai Noel, Isabel!
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E, ao invés disso, olhei devagar para ele e perguntei, Mas Papai Noel anda de ônibus? Aonde está o seu trenó?
Ele nada respondeu, apenas sorriu e me deu um beijo na testa, ao notar meu espanto.
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Descendo do ônibus ouvi minha mãe comentar, Ninguém vai aguentar essa menina contanto essa história a noite toda!
Bom… e aqui está a história mais uma vez para quem já havia escutado; para quem não conhecia, posso dizer que meu coração ainda bate diferente quando me lembro dessa passagem, e minha mãe estava coberta de razão, contei inúmeras vezes para muitas pessoas dessa noite que, para mim, foi encantada!
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Ah! Antes de descer, também dei um beijo no Papai Noel e pelo caminho fiquei pensando, Como é que a gente sabe que o Papai Noel está sorrindo debaixo de toda aquela barba?
Então descobri (e nunca mais me esqueci) que Papai Noel sorri com os olhos e é por isso que eles brilham como estrelas!
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Feliz Natal!